ONG aponta graves falhas na apuração das mortes em operação policial no Rio de Janeiro
Perícia tardia e deficiente gera mais dúvidas do que respostas
A Organização Não Governamental Human Rights Watch (HRW) afirmou que a Polícia do Rio de Janeiro cometeu falhas graves na investigação das 121 mortes registradas durante a Operação Contenção, realizada em 28 de outubro. Em comunicado público, a entidade associou essas falhas a um possível “desinteresse intencional”, em razão de as vítimas pertencerem majoritariamente à população negra e de baixa renda.
De acordo com a HRW, as autoridades policiais não preservaram os locais dos confrontos para análise pericial, medida considerada essencial para esclarecer as circunstâncias em que ocorreram as mortes.
“Estamos profundamente preocupados com o fato de que etapas fundamentais da investigação não foram cumpridas e que provas importantes podem já ter sido perdidas”, declarou César Muñoz, diretor da Human Rights Watch no Brasil.
A operação
A Operação Contenção mobilizou cerca de 2.500 policiais de diferentes unidades do estado, com o objetivo de atingir pontos estratégicos do Comando Vermelho em comunidades dos complexos do Alemão e da Penha, na zona norte da capital fluminense. A ação resultou em intensos tiroteios e na morte de 64 pessoas já no primeiro dia, incluindo civis desarmados e crianças.
As demais mortes ocorreram em uma área de mata da Serra da Misericórdia, após uma emboscada do Batalhão de Operações Policiais Especiais (Bope) em uma das rotas de fuga da facção. Os corpos dessas vítimas foram localizados posteriormente, quando moradores da região os levaram até uma praça na Penha, após registrarem imagens e vídeos do cenário de violência.
Na manhã do dia 29, essas imagens já circulavam amplamente, inclusive fora do estado. Familiares das vítimas relataram à imprensa que alguns corpos apresentavam sinais de rendição, amarrações e indícios de execução e tortura. Segundo a Human Rights Watch, há predominância de pessoas negras e quase totalidade de vítimas pobres entre os mortos.
A ONG ressalta que a ausência de perícia adequada e de isolamento das áreas dos crimes compromete a obtenção de informações essenciais, como a determinação sobre se as vítimas chegaram a disparar armas de fogo.
“As autoridades brasileiras precisam assegurar uma investigação célere, completa e independente sobre cada uma das mortes, bem como sobre as decisões e o planejamento que resultaram em uma operação tão desastrosa”, afirmou Muñoz.
Ele também destacou que o caso evidencia a necessidade urgente de o governo estadual propor uma lei que desvincule a perícia da Polícia Civil, promovendo análises forenses independentes e de alta qualidade, consideradas indispensáveis a qualquer investigação criminal.
A organização ainda criticou as restrições de acesso da Defensoria Pública e de observadores independentes ao Instituto Médico Legal (IML), para onde os corpos foram encaminhados. Entre as recomendações da Human Rights Watch estão a participação de peritos independentes e a condução das investigações pelo Ministério Público.
As polícias Civil e Militar do Rio de Janeiro foram procuradas, mas não se manifestaram sobre as críticas apresentadas pela entidade.
Fonte: Agência Brasil